sexta-feira, 25 de junho de 2010

Mais curiosidades sobre a Peste Negra.

Durante a Idade Média, um dos aspectos mais fundamentais da higiene, o banho, era considerado prejudicial se tomado em excesso. E "banhar-se em excesso" geralmente significava fazê-lo mais de duas ou três vezes por ano. O cheiro de corpos não lavados impregnava todas as casas. Mesmo os monges banhavam-se apenas duas vezes por ano, antes da páscoa e antes do natal. Nas áreas urbanas, o esgoto e a água usada eram simplesmente atirados pela janela, muitas vezes na cabeça das pessoas que tivessem a infelicidade de estar no lugar e hora errados.
As roupas eram lavadas muito raramente, geralmente duas ou três vezes por ano, devido à raridade e ao custo do sabão, e conseqüentemente viviam infestadas de pulgas, percevejos, piolhos e traças. Catar piolhos era uma atividade regular das famílias, sendo mesmo uma forma de lazer. Quem mais corria risco eram os recém-nascidos, já que as mulheres costumavam forrar as camas com lençóis sujos e velhos para dar à luz, pois assim não estragavam os bons. Entre um quarto e um terço das crianças morriam antes de completar um ano e muitas outras antes dos dez anos. De cada dois nascimentos bem-sucedidos podia resultar um único adulto saudável. As casas eram ninhos de ratos, que disputavam com os animais de criação os restos de comida. 
A peste negra se manifesta de três formas: a pneumônica, que ataca os pulmões; a septicêmica, que infecta a corrente sangüínea; e a bubônica, a mais comum, cujo nome deriva das tumefações do tamanho de um ovo, conhecidas como bubos ou bubões, que aparecem no pescoço, nas axilas ou nas virilhas do doente nos primeiros estágios da doença.
Os vetores do bacilo podem ser vários tipos de insetos hematófagos, que o transmitem através da picada. O mais comum destes vetores é a pulga, que na época parasitava tanto o pequeno rato preto dos navios, o rato marrom, muito comum nos esgotos. O bacilo vive alternadamente no estômago da pulga e na corrente sangüínea do rato. Até hoje não se sabe o que precipitou a mutação do bacilo da forma inócua para a virulenta.
A doença era aterrorizante. Os bubões purgavam pus e sangue, e eram acompanhados por manchas escuras, resultantes de hemorragias internas. Os doentes sentiam dores muito fortes e geralmente morriam em até cinco dias após a manifestação dos primeiros sintomas. No caso da forma pneumônica, o doente tinha febre alta e constante, tosse forte, suores abundantes e escarro sangrento, e morriam em três dias ou menos. Em ambos os casos, tudo que saía do corpo - hálito, suor, sangue dos bubões e pulmões, urina sanguinolenta e excrementos enegrecidos pelo sangue - cheirava extremamente mal. A depressão e o desespero acompanhava os sintomas físicos, o que levou alguns cronistas da época a dizer que "a morte se estampava no rosto dos condenados". 
Diante do avanço da praga, a solução mais comum era a fuga. Grandes parcelas da população migraram para o campo, tentando escapar do ambiente insalubre das cidades. A peste era o tipo de calamidade que não inspirava solidariedade. O fato de ser asquerosa e mortal não aproximava as pessoas num sofrimento mútuo,  mas apenas aumentava seu desejo de escapar da mesma sorte. Desse modo, a fuga era generalizada. Fugiam os magistrados e notários, que se recusavam a fazer o testamento dos agonizantes, fugiam os padres, em pânico diante da perspectiva de ouvir as confissões dos moribundos, e fugiam os médicos, o que só piorava o quadro geral. Para muitos, o fim do mundo era tido como certo, o que os levava a procurar o esquecimento no prazer sem freios, "dia e noite, iam de uma taverna para outra, bebendo e farreando desenfreadamente". A devastação causada pela peste diminuiu sensivelmente após 1350, embora a doença permanecesse no continente europeu, de forma endêmica, até o início do século XVIII. Sua marcha mortal pela Europa deixou seqüelas permanentes, que transformaram a relação entre as pessoas, abalaram a imagem de infalibilidade do clero, reforçaram a fé pessoal e aumentaram a popularidade de cultos místicos.  Na arte, mudou a forma de representação da morte, apresentada sempre de forma assustadora, levando com seu abraço os falecidos horrendamente descarnados e torturados, testemunhas permanentes das imensas cicatrizes sociais e psicológicas provocadas pela peste negra.

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